DONA DULCE DE HUMBERTO
O BRILHO DE DONA DULCE
Acostumados com minhas manifestações, que ocorrem sempre na passagem dos aniversários da minha querida Dona Dulce, algumas pessoas estranharam por não terem lido nada escrito por mim, no dia de mais um natalício da minha saudosa Mãe. Devo dizer que todo dia é dia de homenagear aquela que me botou no mundo. Não gosto de legislar em causa própria, mas a minha querida Dona Dulce se relacionou muito mais com este lugar que muitos super homenageados e seus títulos honoríficos de Cidadão ou Cidadã Amapaense. Por isso acho que não foi homenageada como deveria.
Nascida no município de Muaná, Ilha do Marajó, aquela Cabocla adotou o Amapá desde cedo. A primeira vez foi em 1949. Aqui casou-se na velha Matriz de São José, onde eu seria batizado. Quando fomos morar em São Luiz ela aproveitou o tempo livre para nos alfabetizar. Eu e minha irmã Isabel Cristina, de saudosa memória, aprendemos o Bê-á-bá sob a batuta da nossa genitora. Quando retornamos para Macapá, nossa terra querida, a gente sabia ler e escrever de carreirinha, como bem disse o personagem Zeca Diabo na novela O Bem Amado.
Menino ainda, vi de perto o desenvolvimento da mediunidade de minha mãe acompanhando-a em suas idas ao Centro Espírita Frei Evangelista, comandado por figuras como Juvenal Canto e Irineu da Gama Paz. Depois de passar pela Mesa Branca Dulce adotou o Umbandismo, num tempo em que pouca gente em Macapá sabia do que se tratava. Os que não tinham conhecimento sobre o assunto tratavam com desdém e alguns até ultrapassavam as linhas da civilidade, agredindo-a com palavras e atitudes reprováveis.
Dona Dulce se manteve firme e quando meu pai resolveu juntar a Umbanda ao Tambor de Mina, caiu sobre nossa família um tsunami de ofensas de toda sorte. A Igreja Católica viu naquela manifestação de matriz africana algo ameaçador. Por uma dessas ironias do destino meu pai desenvolveu uma amizade com o Padre Italiano Antônio Cocco, pároco da Igreja de Nossa Senhora da Conceição. O Padre precisava de areia para construir a torre da igreja. Meu velho era motorista de uma caçamba, veículo que hoje leva o nome de “caminhão basculante”. Depois de receber o consentimento da Companhia de Eletricidade, dona do veículo, meu pai começou a transportar areia da praia da Fazendinha depositando esse material ao lado da igreja, num tempo em que não havia pá mecânica. Era no braço. Por causa dessa amizade improvável, fomos estudar na Paroquial Padre Dario e depois na São José, que era onde estavam os filhos dos funcionários mais graduados do Território.
Lá a gente se deparou com um negócio que hoje chamam de “bullying”. Por causa do Tambor e da Umbanda fomos alvo de toda sorte de ofensas. De “negro macumbeiro a preto nojento”. Quem nos dava força quando a gente fraquejava era minha mãe . Eu e minha irmã aguentamos todo tipo de atitudes hostis que começavam desde o canto do hino nacional e da reza, antes de ir pra sala de aula. Havia lá também um grupo de colegas que nos protegiam.
A gente sempre lembrava da força que vinha da nossa mãe e por mais que nossos desafetos tentassem, não conseguiam nos atingir de verdade, porque a sombra protetora de Dona Dulce sempre pairou sobre nós e continua nos acompanhando até hoje. Quando vou fazer algo importante e tenho alguma dúvida dirijo-me primeiro à Deus e aos santos, mas mantenho uma conversa conclusiva com minha mãe.
Por isso afirmo que o dia dela não é só no seu aniversário de nascimento. Pra mim é todo dia. E se me for dado o privilégio de ainda encontrá-la nos caminhos da eternidade, vou envolve-la num grande abraço e lhe direi: Obrigado por tudo minha mãe. Que Deus conserve em ti esse brilho estelar que te acompanhou ao longo da tua passagem na terra. TE AMO.
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