POR QUE EU ESCREVO
POR QUE EU ESCREVO
Texto escrito para um amigo do peito
Por Paulo Rebelo
Amigo,
gostaria de compartilhar contigo algo de cunho pessoal. São aquelas coisas que somente conversamos com os amigos (e no desespero até com estranhos que num breve instante nos acolhem), funcionando como uma espécie de "atendimento psicológico": o ombro amigo. É a primeira vez que escrevo abertamente sobre isso. Creio que saberei me expressar. Já era tempo, mas nunca achei tão necessário ou não tinha jeito para me abrir pessoalmente sobre isso sem parecer piegas ou desproposital. Importante sempre foi. Tinha um certo pudor ou vergonha, eis que tenho tendência a ser prolixo, mas que busco neutralizar esse "deslize" de forma pitoresca.
Então, desde já peço-lhe perdão por delongar-me neste texto. Data vênia.
A escrita é uma necessidade vital para mim, creia-me. É o meu ponto de equilíbrio. Ela é meu tratamento e profilaxia para minha enfermidade mental: a ansiedade latente ou inaparente. Tenho "ecos de ansiedade". Ela é "escondida", tanto é que não transpareço isso publicamente, mas ela me é prejudicial, pois distorce minhas emoções, podendo me paralisar ou me fazer agir impulsivamente e corroi o meu intelecto, deixando irritado, impaciente e "burro". É que exerço um autocontrole enorme que me exaure e a acabo por não render física e emocionalmente. Sabe aquele velho ditado de que "um homem não chora" ou que "o médico não adoece". Pois é, ponho "a máscara do tudo bem" e sigo em frente. Não, não está tudo bem. Então, para não gritar nem chorar, escrevo! Às vezes, estou nas nuvens e fico recluso insone horas nas madrugadas.
Assim a escrita é o meu "RIVOTRIL". Defino-a como minha "válvula de escape", "rota segura de fuga" ou minha catarse. Seguramente, é meu "pit-stop" na correria da vida. Ela me faz muito bem, exercendo um "trabalho de prevenção". Outrossim, a escrita faz um bem enorme para a minha cognição, deixando meu cérebro mais "afiado". Aos 67 anos já tenho leve déficit de memórias alternada e dividida. Felizmente, a memória concentrada está 100%. Faz-me um bem enorme para a autoestima e autossegurança emocional, pois através dela consigo me expressar adequadamente sobre o que penso e sinto, por essa razão erro pouco na minha tomada de decisões na família e trabalho. Antes de agir, escrevo, parafraseando a frase "Penso, logo existo" (em latim, Cogito, ergo sum), dita pelo filósofo francês René Descartes. Essa declaração, central no seu sistema de pensamento, sugere que o ato de duvidar e, portanto, de pensar, é a prova irrefutável da própria existência. A minha consciência melhora muito quando escrevo. Portanto, a escrita é o ar que respiro. Ela me força a estudar o português clássico, literatura e filosofia, algo que não é minha praia. Torna-me mais culto, inteligente e intelectualizado. Torno-me mais leve e "interessante". As pessoas ao meu redor prestam mais atenção no que digo e faço. A pior coisa para um homem é não ser levado a sério nem ser crível. Superei essa fase. Ela me envaidece, sobretudo, me enriquece como ser humano. Enfim, me faz viver melhor.
O efeito colateral disso é que acabei por me tornar um homem mais crítico, cético e dogmático, às vezes, chato para mim mesmo, parecendo um ermitão, pois filosofo demais, mas sem o ar professoril, pois não sou orgulhoso nem vaidoso. Não perdi a essência de quem sou (um pobre que apenas enriqueceu) nem minhas claras limitações, que não as escondo, por isso recorro sempre à minha mulher, filhos já adultos e aos amigos do peito como tu. Outro momento te escreverei sobre o algoritmo que criei para não falhar na vida. A ajuda dessa gente é imprescindível; não faço nada sem antes consultá-la.
A medicina tende a colocar o médico no Olimpo dos semideuses e ciente dessa ilusão ou armadilha, a escrita é o antídoto, visto que se a medicina enobrece o homem por suas ações, paradoxalmente, ela o embrutece e o emburrece, pois imagine passar 24 horas por dia, 7 dias na semana, 12 meses por ano e a vida inteira cuidando de enfermos, respirando a cronicidade de doenças, a incapacitação permanente e a inexorabilidade da morte, esquecendo de si mesmo, isolando-se socialmente, inclusive, afastando-se da própria família. É a morte precoce! Por esse motivo, médicos separam-se, adoecem e morrem mais cedo do que a média da população. O paradoxo é: "o homem que empobreceu à medida que enriquecia". A escrita me fez enxergar a realidade! Não quero esse destino para mim.
Acabei por me tornar um "chupa cabra intelectual", lendo tudo que me mandam e não só por educação os respondam, mas principalmente, interagindo com meus amigos, pois se o homem é uma ilha cercada de água por todos os lados, há de construirmos pontes, não é verdade? Portanto, a escrita é o meu ponto de encontro com meus amigos! A Internet facilita isso, mas jamais substitui o encontro pessoal, por isso insisto com os amigos dizendo brincando, mas p'rá valer: vamos nos encontrar?
De teu amigo Paulo Rebelo, médico escritor e poeta
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