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Mostrando postagens de abril, 2021

CUÍRA

  CUÍRA* Poema de Paulo Rebelo Eu te entendo, Perfeitamente, Meu amigo, Essa tua cuíra, Essa coisa que vem De dentro para fora, Vai rasgando tuas entranhas Até sangrar E não passa nunca; É a cuíra! Eu, também, já tive surtos! Eu sofro desse mal. Sou solidário à tua cuíra. A cuíra é incurável; Ela não pode ser extinta Nem atamancada! Pois, ela volta pior Quando sufocada. Quem sofre dela É irrecuperável. Um dia, A cuíra quase me matou. Ela não faz isso por maldade. Ela é assim mesmo: Ousada, Abusada, Intrusiva, Maníaca, Psicopata! É inconstante Imprevisível Mas vive me atiçando Até o sexto sentido, Chacoalhando sentimentos, Desmoronando fundamentos; Tenho que satisfazer Seus caprichos e vontades. De tanto lutar contra ela, Desisti; Aceitei que eu sou a própria cuíra. Paulo Rebelo, o médico poeta. *Agitação, inquietude, buliço

O MILAGRE

O MILAGRE Crônica por Paulo Rebelo Antes de te falar sobre o ocorrido, gostaria de perguntar se tu acreditas em milagre? Já testemunhaste algum? Eu não acreditava; a bem da verdade, alheio a isso, nem sabia o que era isso e cético, duvidava de tudo até que fui me convencendo de que de uma forma ininteligível, milagres existem, sim. Eu já havia encerrado o meu consultório por volta da 21 horas, quando ao acaso encontrei duas senhoras no longo e sombrio corredor do hospital, que logo vim a saber que se tratava de mãe já idosa, na casa dos 85 anos, cadeirante, de cabelos grisalhos, fragilizada e de voz baixa e entrecortada, pouco ofegante e a filha que parecia aflita e desnorteada. "Desculpe-nos, o senhor é médico?", esta me perguntou. "Sim, em que posso ajudar?" Bem, o fato é que por motivo que não saberia explicar, a idosa que apresentava infarto do miocárdio foi liberada para casa, talvez, pelo fato de se tratar de um ataque cardíaco incomum; sem dor explicita e ape...

A PRAGA

  A PRAGA Crônica por Paulo Rebelo Durante um par de anos convivemos incomodados com um vizinho problemático. Todos dias pela manhã e no final da tarde, para entrar e sair prédio, buzinava a sua HILUX 4x4 e assustava ou acordava as nossas crianças. Militar das Forças Armadas, de patente mais alta do que a minha, sujeito boçal, quando se dirigia aos demais condôminos, era dando ordens. O povo morria de medo daquele elemento, menos eu que já o havia encarado umas três vezes. Era um jovem na época no fim da Ditadura Militar e não entendia muito bem o momento histórico. Não existia delegacia do meio ambiente, ministério público onde eu pudesse denunciá-lo por perturbação do sossego. E denunciar um militar nas próprias Forças Armadas? Nem pensar! Às vezes, me pergunto onde eu estava com a cabeça ou tinha coragem para enfrentar esse homem, ainda mais que ele só andava armado. Já eu não. Coisa de jovem idealista ou irresponsável. Creio que era uma mistura dos dois. Sua mulher era um doce...

A INSATISFAÇÃO

A INSATISFAÇÃO Por Paulo Rebelo Ah! Essa inquietude  Ainda há de me matar um dia. É uma ebulição  Que me coze aos poucos, Um esfriviamento Que não acaba nunca, Uma eterna insatisfação. Pois estou sempre com fome  E a camisa, de tão apertada, Nunca me cai bem.    Nunca estou pronto;  Sempre falta um pedaço, Uma incompletude, Um estado perene De inacabamento  De minha alma,  Que parece querer estar  Em todo lugar,  Mas não de estar  Em lugar nenhum. Se estou aqui,  tenho que ir embora,  Se estou lá,  Tenho que voltar; Ficar nunca;  Agitar é minha sina,  Quando, muitas vezes,  Desejei apenas o silêncio  E sossegar. Assim sou eu: Um vazio a ser preenchido, Um tempo a ser consumido. Paulo Rebelo, o médico poeta. Na imagem, SÍSIFO, cuja sina é carregar a pedra ao topo da montanha.

O FILHO DE DEUS

O FILHO DE DEUS (desolação) Por Paulo Rebelo  A caminho de casa. São 9 da noite. Estou cansado... Chega por hoje. Dei de mim o que pude no consultório. Mas, nunca é o bastante, Eu sei (É o que me diz a minha consciência para me azucrinar). Diga-me: Que sentimento horrível de culpa é esse? Que mal eu fiz afinal? O que fiz para que minha consciência me trate como réu? Por que me parece que fiz tudo errado, que deixei algo pela metade, que preciso refazer ou recomeçar tudo de novo, como seu eu levasse a minha vida com desídia?  Não posso sequer dormir em paz  E pior, nem ter o direito de errar... Faz meia hora que rodo pela cidade vazia pela pandemia*. É uma cidade fantasma que nem eu me sinto hoje: um fantasma de carne e osso! Desde a noitinha,  No consultório, eu já rodava na "reserva de paciência", buscando energia do fundo do tacho. Cá estou eu rodando com tanque vazio de fé, sendo que o nível da bateria zerou. O rastilho de esperança molhou. Tenho a impressão que v...

CAFÉ DA MANHÃ

A TI, meu amigo-A, meu irmão. ACABEI de criar esse texto, essa conversa(hipotética entre nós dois). GUARDE-O como lembrança de teu amigo. Sou poeta, lembre-se. Poderiam ser essas palavras de qualquer pessoa p ti agora pela manhã. 🍁🍁🍁 CAFÉ DA MANHÃ (A boa nova ou ainda a esperança) Por Paulo Rebelo  Sim, vamos tomar um café? (eu diria pra ti). Tenho tantas coisas p te dizer... Aconteceram tantas coisas ruins, mas felizmente, mais coisas boas do que ruins, às vezes, pequenas, mas de enorme valor, por certo simbólico, todavia providencial, como um copo d'água para matar minha sede ou mesmo, a chuva há muito tempo desejada que caiu nessa semana no semiárido, tornando o solo verdejante, depois de morrer tanta gente e animais por falta d'água, finalmente, trazendo um fio de esperança de fartura no campo, sinônimo de alimento para matar a fome. Estava morrendo física e emocionalmente. Meu espírito já perambulava sem rumo. Perdi desejos e sonhos...  Estava à beira da loucura, desal...

O GUARDA COSTA

O GUARDA COSTA Crônica by Paulo Rebelo Há duas décadas, durante aproximadamente sete anos, atendi um senhor na casa dos 75 anos, caucasiano, descendente de alemães, portador de doença cardíaca avançada, depois de um infarto que deixou seu coração fraco. Militar da reserva, outrora um homem ativo, a doença deixou sequela, levando quase toda a sua vitalidade, tornando-o parcialmente, todavia tendo sido militar, pela sua rígida formação moral, guardava o porte de nobre homem; era um homem extremamente disciplinado e organizado, franco do tipo que dá ordens "e que não leva desaforo para casa", portanto em nada abateu o seu moral. Pelo contrário, acreditava que com os remédios estaria bem para ir adiante na vida, era o que importava, dizia. "E a patroa? E os filhos, HERR SCHNELL?", perguntava eu; "Tá tudo criado!", dizia abananando com a mãos. A simpatia mútua foi quase que instantânea desde o início. Sempre respeitoso, nunca foi exigente além da necessidade de...

O MÉDICO

ACERCA DO POEMA A SEGUIR. Por Paulo Rebelo O médico, um ser humano exausto de tantas guerras pela vida, à beira do loucura, busca entender o que está lhe ocorrendo diante da tragédia da morte e já quase sem forças, indaga o paciente lhe pedindo ajuda para sobreviver e assim continue a lutar, uma vez este sempre foi ajudado por ele quando mais precisou. 🩺💉💊 O MÉDICO  (Le Docteur) ●QUEM ÉS TU? •Qui etes-vous? ●MINHA SECRETÁRIA? •Ma secretaire? ●MINHA MULHER? •Ma femme? ●MEU PACIENTE? •Mon cher client? ●PERDOE-ME Excuse-moi, ●NUNCA SEI... •Je ne sais pas jamais... ●ONDE ESTAMOS? •Oú sommes-nous? ●QUE DIA É HOJE? •Quel jour est aujourd'hui? ●SEGUNDA? ●TERÇA? ●QUARTA OU DOMINGO? •Lundi? Mardi? Mercredi Ou dimanche? ●BEM, O QUE IMPORTA? •Que import? ●ONDE ESTOU? EM CASA OU NO MEU CONSULTÓRIO? •Oú suis-je? •Dans chez moi  •Ou dans mon cabinet? ●VIVO OU JÁ MORTO? •Vivre  Ou dejà mort? ●É ESTRANHO •C'est trop étrange, ●É TARDE! •C'est tard! ●MEU CAFÉ ESFRIOU •Mon café est froid...

LE MEDICIN

 🩺💉💊 LE DOCTEUR  Pour Paulo Rebelo Qui etez-vous? Ma secretaire? Ma femme? Mon cher client? Excuse-moi, Je ne sais pas jamais... Oú sommes-nous? Quel jour est aujourd'hui? Lundi? Mardi? Mercredi Ou dimanche? Que import? Oú suis-je? Dans chez moi  Ou mon cabinet? Vivre  Ou dejà mort? C'est trop étrange, C'est tard! Mon café est froid! Est-ce que c'est-il un rêve?  Car Je dorme. Ça me fait bien. Ça fait... Combien des jours? Quesque se passe,  Pas avec vous, mais avec moi? Je n'ai sais pas plus! Je suis ici oú lá? Je sais rien! C'est un couchemer! Je suis fou, Crois-je! Je vais changer ma têtê  Elle est dejà perdue Une fois,  Quelque lieu Dans le mond,   Pour un instant, Au fond de la mer, Peut etre  au cielle Qui sais... AIDEZ-MOI, MON PACIENT! Soyez  Mon docteur, S'il vous plaît! Depechez-vous! C'est une URGENCE! Prennez-moi Quelque Medicament Que calme  Ma couer  que palpiter Rapidement! Je suis tard! ❤❤❤ Paulo Re...

FALTANDO UM PEDAÇO

FALTANDO UM PEDAÇO Por Paulo Rebelo Falta um pedaço de algo no HOMEM Que se perdeu pelo caminho Ao longo do tempo.   Lembra-nos um gosto amargo de fel E, estranhamente, Parece nos impedir de seguir Adiante livre e sem culpas.   Então, vivemos a procurá-lo Às cegas e em todo canto, Como se fosse a chave extraviada De nossa casa, Como se fosse a coisa mais importante Para continuar vivendo Ou a ser vivida para sermos felizes, Todavia sem saber como Nem quando ou onde encontrar. A ânsia pelo que há de vir...   Ah! Essa eterna dúvida, A insegurança Pela infinita incompletude da alma, Presa a um passado Que não voltará jamais E um futuro incerto,   São a única certeza: Uma vida não vivida.       Paulo Rebelo, o médico poeta.

ADEUS

Aos que se foram vítimas da COVID-19. ADEUS Por Paulo Rebelo  Nada mais parece seguro  Nessa terra Que parece tão ilusória Ao mesmo tempo  Em que é sonho e pesadelo.  E tanto enleva e faz sofrer A tal ponto de se desejar viver  Para sempre  Ou morrer tamanha dor terrena. Pois a vida vai se gastando Aos poucos  Como uma vela apagando E de repente, um dia, indistintamente,  Todos ao redor se vão,  Deixando um imenso vazio, Uma brecha na alma, Juntando mais sofrimento E resta a solidão dos pensamentos Sob imensidão dos céus, Sem antes ter passado Por infernos astrais, Um dia desejando que tudo se acabe, Levando consigo na mala  Saudades eternas. Apenas DEUS para nos perdoar  E confortar. Paulo Rebelo, o médico poeta.