SAUDADES ETERNAS
Por Paulo Rebelo
Os últimos dias me fizeram refletir muito sobre minha vida. É que perdi dois grandes amigos da era de minha adolescência, ambos na sexta década de vida. Eles não se conheciam. Morreram "jovens" aos 67 anos, a mesma idade minha, na primeira fase da velhice. Sabia que estavam muito doentes, mas com reserva acalentava alguma esperança de cura ou melhora. Eu mesmo estive enfermo. Desde então, tornei-me muito sensível à noticias assim. Então, ontem, exatamente no Dia de Finados, no momento em que nos encaminhávamos ao cemitério para honrar a memória de meu falecido pai Evandro, soube de suas mortes. Chorei por dentro, pois ambos me remetem à belas reminiscências, quando estudávamos em dupla, jogávamos bola, saíamos para passear; o mundo parecia mais leve, puro e menos complicado. Não tinhamos as responsabilidades nem preocupações da vida adulta.
Havia cerca de 50 anos que a gente não se falava. Nem sequer sabíamos por onde andávamos, como estávamos, mas depois que nos reencontramos através das redes sociais há poucos anos, passamos a nos comunicar com relativa frequência, conversando pelo telefone, enviando mensagens de voz, textos, fotos pessoais e familiares. Então, por que tanta dor e saudade? A saudade de um tempo que não volta mais.
Acontece que eu mesmo mudei a minha percepção sobre minha existência na terra. Isso ocorreu depois que tive um infarto do miocárdio em fevereiro de 2025. Pelo fato de ter alcançado sucesso pessoal e familiar na vida, eu, médico há 41 anos, feliz e realizado ao lado de Bernadete Rebelo há 43 anos e tendo todos os cinco filhos na medicina, eu dizia, orgulhamente, para mim mesmo: "olha, o que é que eu quero mais?". Às vezes, por conta disso, comentava com Bernadete e todos que seu morresse hoje, morreria com sensação de dever cumprido; havia chegado minha hora de partir, crente que eu só devesse administrar e aproveitar o tempo de vida que me restasse, como se eu tivesse poder sobre isso.
O fato é que quando percebi que estava tendo infarto agudo do miocárdio e que poderia morrer, me assustei, mas não me desesperei. Não fugi da realidade. Subitamente, um filme de minha vida em "cine loop" passou na minha cabeça em 1 minuto. Pensei: "eu não quero morrer; Deus, eu quero viver!" E numa súplica, silenciosamente, estava LHE pedindo uma nova chance para continuar vivendo e terminar minha obra. Dentro de 25 minutos eu estava no hospital. Então, quando meu filho cardiologista Bruno Rebelo, disse, firme e peremptoriamente: "pai, eu vou te levar agora para o cateterismo cardíaco!", suspirei aliviado; pensei: "pronto, agora eu não morro!" Percebi que durante muito tempo andava dizendo a asneira que "se morresse hoje, morreria feilz". Pensando bem, uma grande bobagem, uma blasfêmia diante dos desígnios de Deus, pois é tão bom estar vivo. E olha que interessante; meu filho é quem me salvou, depois de eu ter lhe dar a vida e orientação! Bernadere e eu o colocamos no mundo. Ele tinha que ser o meu cardiologista que haveria de me salvar. Milagres acontecem!
Assim, tendo testemunhado meus queridos amigos André Bolonha Fiuzza de Mello e Ricardo Cézar Carvalho Fernandes partirem (que Deus os tenha ao Seu lado), fui relembrado para a imprevisibilidade e finitude da vida; da finalidade de continuar minha missão na terra ao lado das pessoas que amo e por elas sou amado; praticando o bem, fazendo a coisa certa; "de amar o próximo como a ti mesmo.", disse Jesus Cristo (Mateus 22:37-39).
Paulo Rebelo, médico escritor e poeta.
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